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19 de Abril de 2024

Maria da Penha: Medida protetiva de afastamento do trabalho deve ser acompanhada de auxílio-doença

6ª Turma do STJ decidiu que a medida prevista no art. 9º, §2º, II da lei Maria da Penha traz à vítima da violência doméstica, de forma analógica, o direito a perceber o benefício

Publicado por Aislan Machado
há 5 anos

Em decisão publicada no Diário de Justiça Eletrônico em 02/09/2019, proferida nos autos do Recurso Especial 1757775 em sessão do dia 20/09/2019, a 6ª Turma do STJ supriu omissão legislativa e fixou entendimento de que a vítima de violência doméstica que tenha deferido em seu favor a medida protetiva de "manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses" (art. , § 2º, II, da lei 11340/2006) como necessária à preservação de sua integridade física e psicológica tem direito à percepção de auxílio-doença no período que exceda os 15 dias do afastamento, a ser pago pelo INSS (sendo os 15 primeiros de responsabilidade de seu empregador).

Segundo o Relator, Ministro Rogerio Schietti Cruz, na falta de legislação específica esta medida é a mais razoável para garantir a máxima efetividade dos direitos da mulher vítima de violência doméstica e fazer frente aos compromissos assumidos pelo Brasil em seu texto constitucional (art. 226, § 8º, da Constituição da República), no plano internacional (Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher - Cedaw - e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher - Convenção Belém do Pará) e da própria lei 11340/2006 (Lei Maria da Penha).

Ficou ainda definido que o próprio juízo estadual especializado nas ações de violência doméstica (ou em sua falta, o juízo criminal) tem competência para deferimento da medida (discutiu-se no processo se a competência não seria da Justiça do Trabalho) e que este afastamento tem natureza de interrupção do contrato de trabalho (tendo portanto a trabalhadora direito à percepção dos salários do período e cômputo do mesmo como tempo de serviço, para efeitos de aposentadoria). Se concedida a medida pelo juízo estadual, este deverá oficiar o empregador e o INSS para efetividade da medida.

Nos autos em que foi proferida a decisão, uma mulher vítima de violência doméstica que já havia tido deferida em seu favor outras medidas protetivas deixou de comparecer ao trabalho por temer novas agressões de seu ex-companheiro e requereu perante o juízo criminal no qual tramitava seu processo a concessão do afastamento previsto no art. , § 2º, II da Lei Maria da Penha. O pedido foi negado sob o fundamento de incompetência do juízo para sua apreciação, decisão que foi confirmada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Da decisão ainda cabe recurso (eis que os prazos se iniciaram em 12/09/2019), mas se trata de grande avanço rumo à proteção integral da mulher em sociedade histórica e estruturalmente machista.

Segue ementa da decisão para informação de meus leitores:

RECURSO ESPECIAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. MEDIDA PROTETIVA. AFASTAMENTO DO EMPREGO. MANUTENÇÃO DO VÍNCULO TRABALHISTA. COMPETÊNCIA. VARA ESPECIALIZADA. VARA CRIMINAL. NATUREZA JURÍDICA DO AFASTAMENTO. INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PAGAMENTO. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA. FALTA JUSTIFICADA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO. AUXÍLIO DOENÇA. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARCIALMENTE. 1. Tem competência o juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou, caso não haja na localidade o juízo criminal, para apreciar pedido de imposição de medida protetiva de manutenção de vínculo trabalhista, por até seis meses, em razão de afastamento do trabalho de ofendida decorrente de violência doméstica e familiar, uma vez que o motivo do afastamento não advém de relação de trabalho, mas de situação emergencial que visa garantir a integridade física, psicológica e patrimonial da mulher. 2. Tem direito ao recebimento de salário a vítima de violência doméstica e familiar que teve como medida protetiva imposta ao empregador a manutenção de vínculo trabalhista em decorrência de afastamento do emprego por situação de violência doméstica e familiar, ante o fato de a natureza jurídica do afastamento ser a interrupção do contrato de trabalho, por meio de interpretação teleológica da Lei n. 11.340/2006. 3. Incide o auxílio-doença, diante da falta de previsão legal, referente ao período de afastamento do trabalho, quando reconhecida ser decorrente de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher e deve ser equiparada aos casos de doença da segurada, por meio de interpretação extensiva da Lei Maria da Penha. 4. Cabe ao empregador o pagamento dos quinze primeiros dias de afastamento da empregada vítima de violência doméstica e familiar e fica a cargo do INSS o pagamento do restante do período de afastamento estabelecido pelo juiz, com necessidade de apresentação de atestado que confirme estar a ofendida incapacitada para o trabalho e desde que haja aprovação do afastamento pela perícia do INSS, por incidência do auxílio-doença, aplicado ao caso por meio de interpretação analógica. 5. Recurso especial parcialmente provido, para a fim de declarar competente o Juízo da 2ª Vara Criminal de Marília-SP, que fixou as medidas protetivas a favor da ora recorrente, para apreciação do pedido retroativo de reconhecimento do afastamento de trabalho decorrente de violência doméstica, nos termos do voto. (RESP - RECURSO ESPECIAL - 1757775 2018.01.93975-8, ROGERIO SCHIETTI CRUZ, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:02/09/2019 ..DTPB:.)
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